quarta-feira, 29 de novembro de 2017

Vamos pensar em artes?


Ao fechar seus olhos e pensar no lado crítico da arte, o que você imagina? A Mona Lisa de Da Vinci? A “Oitava Sinfonia” de Beethoven? A Virgem Velada de Strazza? Entre estas e outras obras que são remetentes a grandes criações artísticas, as quais são consideradas grandes obras da arte, temos logos noções pré-concebidas de que artes é Picasso, Michelangelo, Da Vinci e Beethoven.
Quando falamos sobre artes abrimos um leque de diversidade. A arte brasileira foi influenciada por diversos estilos, e existe – e resiste – desde a pré-história com as artes primitivas. Também é marcada pela arte indígena, pela europeia, no período colonial, e pela africana. Ela se manifesta em diferentes formas, como na dança, na pintura, no teatro e na literatura. A etimologia da palavra vem do latim ars, artis – "maneira de ser ou agir, habilidade natural ou adquirida", sendo uma forma de expressão e manifestação do ser.
Porém outras formas artísticas são discriminadas por sua origem social, como grafite, rap, funk, xilogravura, hip hop, break, web designer, ... que estão ganhando espaço aos poucos, em um processo lento, já que os artistas não recebem apoio, tanto da parte social como da parte governamental.
Com as recentes polêmicas acerca da performance no Museu de Arte Moderna (MAM) de São Paulo, é notório que no Brasil ainda não se tem uma valorização da arte. “Como estudante de arte, tenho mais contato com o que a sociedade rotulou como sendo arte”, diz o artista e estudante de licenciatura em Artes Visuais da UFRN, Thiago Hilen. Em uma sociedade conservadora como a brasileira, onde artistas são taxados como “vagabundos”, não se é valorizado o valor (monetário) da obra. Além de tudo isso, o povo brasileiro é quem menos frequenta espetáculos culturais, como dança, música e teatro em pesquisa realizada pelo Sesc em 2013.
Apesar das polêmicas e dos protestos de boicote à arte – há muito anos já sofrendo boicote no país – convivemos com a arte em nosso cotidiano e ela caminha, ainda, junto da tecnologia. Os artistas têm de se adaptarem às novas tecnologias, usando-as como ferramentas para criar e expor suas artes e, com isso, ganhar mais visibilidade. “A arte é transgressora por natureza. Nos faz pensar. É o espelho que reflete o nosso inconsciente”, diz Frei Betto, frade dominicano e autor brasileiro.
Ao nos depararmos com essas ideias realizamos três entrevistas com jovens artistas do RN, procurando saber como a arte é vista hoje, quais são as concepções e conceitos, como a arte se relaciona com a tecnologia e a sociedade sob a perspectiva eu artista. 
Conheça nossos entrevistados:
Thiago Hilen Dias Vieira é um artista natural de Natal-RN e é estudante do curso de Licenciatura em Artes Visuais da UFRN. Nesta entrevista, Hilen, como é conhecido entre amigos e familiares nos apresenta a sua concepção de arte e a função que ela exerce no cotidiano de uma sociedade.
Fernanda Félix, Suburbana Tipo A, escritora, poetisa, design e produtora cultural.
Luan Santos é natalense, tem 25 anos e é estudante do curso de Tecnologia da Informação na UFRN. Sua produção artística sempre se deu no âmbito da tecnologia em marcas, banners, layouts e etc.


01 - Qual o seu conceito de arte?

Hilen: Arte é toda e qualquer manifestação de atividade humana, abrangida por uma imensa variedade de linguagens, que possua um conceito próprio por trás.
Suburbana Tipo A: a arte é o meio de expressar sentimentos e sensações, emoções e ideias, independente da manifestação artística usada para emiti-la, a arte é algo intrínseco, a arte é singularidade.
Luan: Considero arte qualquer expressão de ideias, que são sintetizadas em diversos tipos de materiais ou plataformas.

02 - Como a arte se manifesta no seu cotidiano?

Hilen: Não tem como não ver a arte se manifestando no nosso cotidiano, por mais que passe despercebido, ela está lá, seja num anuncio publicitário, numa roupa, numa música, pois a arte possui uma vasta variedade de linguagens, como já disse antes. Como estudante de arte, tenho mais contato com o que a sociedade rotulou como sendo "arte". Passando pelo departamento de artes pode-se ver facilmente pessoas tentando se expressar artisticamente, seja dançando, encenando, pintando, ou apenas conversando sobre arte.
Suburbana Tipo A: A arte pode ser discreta e simples ou pode ser o contrário, a arte pode ser o que quiser. Um pixo é arte, desde que meus olhos ou algo na minha mente me direcione a este pensamento.
Luan: A arte se manifesta em praticamente tudo no meu dia a dia. Placas, cores, disposição de objetos, tudo pode me inspirar em novos trabalhos.

03 - Qual a função da arte na sua visão?

Hilen: É evidente que a arte possui inúmeras funções, ela pode entreter informar, criticar, expressar pensamentos e tudo mais. Contudo, para mim, a principal função da arte é ela conseguir concretizar pensamentos, sentimentos do artista, que muitas vezes a linguagem verbal, por mais que também possa ser uma vertente para se fazer arte, não dá conta de expressar.
Suburbana Tipo A: inventar a vida e ser inventada.
Luan: Comunicar as pessoas uma ideia ou sentimento do autor.

04 - Você considera a arte importante para a sociedade?

Hilen: A arte sempre teve um papel importantíssimo na sociedade, desde o inicio dos tempos ela serve para documentar acontecimentos, relatar momentos históricos, pensamentos da época e etc. Atualmente, a arte não é mais tão documental, podemos vê-la tendo um teor mais crítico, seja criticando o governo, o comportamento humano, e tudo mais.
Suburbana Tipo A: Essencial. A arte serve para contar histórias, tudo é arte, desde um idioma falado, um código, o desenho de uma criança...
Luan: Sim! Todas as pessoas deveriam ter acesso as mais variadas formas de arte.

05 - Você considera que a arte e a tecnologia estão lado a lado?

Hilen: Não tenho muita propriedade para falar sobre a relação entre arte e tecnologia, mas acredito que elas caminhem juntas sim. Com a criação de novos recursos tecnológicos, os artistas vão tendo que se adaptar e pensar em como usar esses recursos para fazer sua arte, um exemplo muito forte é a arte digital feita no photoshop, illustrator e etc. A tecnologia não só nos deu ferramentas de criação, mas também ferramentas e exposição, redes sociais como o instagram, por exemplo, nos permite expor nossa arte com um alcance mundial, o que para o crescimento do artista é uma coisa incrível, pois ele ganha uma visibilidade que não era possível ser alcançada alguns anos atrás.
Suburbana Tipo A: arte e a tecnologia andam juntas o tempo inteiro. Tudo que é hábil é tecnológico. A arte tem um potencial de transformar e completar lacunas como a tecnologia.
Luan: Creio que não em todos os âmbitos da arte. Mas no meu cotidiano de trabalho estão totalmente ligadas.

06 - Quais os prós e contras ?

Hilen: Não vejo pontos negativos no avanço da tecnologia no que diz respeito à arte. Como já disse anteriormente, a fácil exposição, a visibilidade que a tecnologia nos trouxe é incrível. É muito mais fácil fazer arte e publicar pra todo mundo ver, isso encoraja outras pessoas a fazer arte também, e, a meu ver, quanto mais arte existir, melhor.
Suburbana Tipo A: levando em consideração que a tecnologia pode transformar coisas, ao mesmo tempo que a arte pode transformar as pessoas, não existem muitos pontos contras. Mas como já disse, arte é singular, talvez se apropriar de uma técnica ou tecnologia pode ser um ponto negativo. A facilidade de se apropriar.
Luan: Entendo que não existem "contras". Em relação aos "prós", creio que a tecnologia pode viabilizar o acesso da população a diversos tipos de arte.

07 - Sua opinião sobre a massificação da arte.

Hilen: A massificação da arte é necessária para inclusão do povo na arte, porém o modo como é massificado nem sempre é tão legal. A mídia é o maior transmissor de arte para a maioria da população, assim ela consegue controlar o que a população vê e consequentemente como pensa.
Suburbana Tipo A: Ela já é explícita. Só uma questão de observação dos não-artistas ou artistas inatos. O entretenimento serve para massificar a arte (risos) a arte é de todo mundo.
Luan: Entendo ser muito importante que a arte esteja disponível a grande massa da população, mesmo sabendo que a curto prazo essa população não se interessaria por arte. Porém a longo prazo teríamos uma nova geração que crescerá com esse contato mais próximo com a arte, e consequentemente com um maior interesse que a geração passada.

08 - Até onde a arte é acessível na sua visão?

Hilen: A acessibilidade na arte, por mais que hoje seja mais fácil ter acesso a conteúdos artísticos, ainda é uma questão negligenciada. Devido a falta de conhecimento e de interesse da maioria da população o acesso a arte é mais difícil para a massa que não pertence a elite, pois dificilmente a arte é direcionada ao público popular.
Suburbana Tipo A: Até o ponto em que estamos dispostos a percebê-la.
Luan: Ao meu ver a arte é pouco acessível, por dois principais motivos: falta de interesse da grande massa por esses conteúdos e inviabilidade econômica para grande parte da população consumir arte.

A visão contemporânea da arte faz com que ela se torne palpável e não mais um objeto, uma exclusividade de uma elite. Uma tela que há séculos atrás prendia a atenção por seu valor artístico, hoje pode ter o mesmo valor daquela música de dois minutos daquele cantor sertanejo. Podemos entender a arte como revolucionária, sobrevivente que se adapta a épocas e estilos, se apropria da ciência, da religião, da politica ou apenas se integra a elas. 

Produzido por Sulamita Lima de Oliveira.
Redação por Maria Clara Lima.
Reportagem feita por Antônia Danielle e Larissa Eufrasio.
Fotografia de Rafael dos Santos.
Editado por Gláucia Oliveira.

segunda-feira, 27 de novembro de 2017

"Conheça a si próprio."

Uma biblioteca em busca de sua própria história


Uma biblioteca meio "fantasma e com amnésia" busca reconstituir sua própria história. Incrível, mas existe: trata-se da Biblioteca Setorial do Centro de Ciências Sociais Aplicadas (CCSA) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte.

Ela não possui uma, digamos, certidão de nascimento - não há portaria ou resolução sobre sua criação, aparentemente um mistério - mas existe fisicamente desde pelo menos meados de 2006 e parece invisível, dado o pouco conhecimento das pessoas dentro do próprio Campus UFRN a respeito do espaço e a quase inexistência de informações na internet, mesmo nas páginas institucionais da UFRN.

Primeiro, o Destaque

Que biblioteca é essa? Hora de pesquisar e buscar informações. E eis que, em meio às indagações, surgiu uma pré-história da "Setorial". Era uma vez um espaço repleto de livros que ocupava as duas últimas salas de aula do Bloco D do Setor de Aulas Teóricas V e pertencia inicialmente ao Curso de Pedagogia - chamava-se Destaque Bibliográfico, e o acervo do espaço foi criado a partir de doações de professores.

Mas, quando surgiu o Destaque Bibliográfico? Há uma data precisa ou, ao menos, aproximada? "O Destaque existia desde o advento dos cursos de Graduação..." - calculou Maria Arlete Duarte Araújo, diretora do Centro de Ciências Sociais Aplicadas (CCSA) - "Se tomarmos como base o curso de Administração, que é o curso (com pós-graduação) mais antigo do CCSA, podemos pensar em uns 40 anos atrás". Para se ter ideia, a pós-graduação em Administração teve o projeto aprovado em junho de 1977, e em maio de 1978 o projeto de Mestrado do curso foi aprovado; o Setor V nessa época, estava em fase final de construção.

"(O Destaque) Era um ambiente informal no Setor V, uma área de 274 metros quadrados", prosseguiu Arlete. Ex-alunos de Comunicação Social na primeira metade da década de 1990 lembram de um espaço que lembrava uma mini-biblioteca no local indicado, o que é referendado pelos funcionários mais antigos da Setorial, que participaram da mudança do acervo para o local atual.

Com o passar do tempo, o Destaque passou a abrigar, além do material de Pedagogia, o acervo do Curso de Administração, e aos poucos foi aglutinando acervos de outros cursos abrigados pelo Centro de Ciências Sociais Aplicadas.

Anos difíceis

Porém, o Destaque não era reconhecido formal ou oficialmente como biblioteca, sequer setorial - pela legislação à época, e durante muitos anos, só eram reconhecidas como bibliotecas setoriais as situadas fora e longe do Campus UFRN - , e por isso tinha algumas limitações.

Por exemplo, nenhum funcionário pertencia ao Destaque em si. "O quadro de bibliotecários não era próprio, era formado por colaboradores terceirizados" - anotou Shirley de Carvalho Guedes, bibliotecária da Setorial desde 2007-2008, e que há algum tempo tem "garimpado" a história do local, contado com relatos orais e eventuais documentos para contruir um fio de história - "Este foi um dos problemas que levaram a não se registrar a história deste local em um suporte". 

O fato de não se ter um quadro próprio de funcionários, não bastasse a quantidade reduzida dos mesmos, pesava na organização do acervo, que era mínima. Impossível dar conta. "(O Destaque) Funcionava mais como um depósito. Os acervos que vinham de outros cursos eram 'jogados' lá, e se fazia um registro improvisado desse material", relatou Arlete.

Além disso, segundo antigos funcionários do Destaque que hoje atuam na Setorial, não havia empréstimo de publicações; as consultas só podiam ser feitas no local - inicialmente apenas por professores e pelos alunos de Pós-Graduação (mais tarde, foi estendida a alunos de Graduação).

Do Destaque ao NEPSA

Em abril de 1997, de acordo com levantamento de Shirley, o Destaque foi incorporado ao Sistema de Bibliotecas (SisBi, implantado em 1959 com a criação da Biblioteca Central, atualizado e expandido ao longo dos anos) como biblioteca especializada - a coordenação técnica ficou a cargo da Biblioteca CentralZila Mamede, e a administrativa com a direção do Centro de Ciências Sociais Aplicadas (CCSA). O acervo? Permaneceu onde estava, no Setor V, ainda não havia um espaço específico para ele... e assim permaneceu até a segunda metade da década de 2000.

Em 22 de junho de 2006 foi inaugurado o Núcleo de Estudos e Pesquisas Sociais Aplicadas (NEPSA). E a "Setorial", nas dependências do Núcleo? "A biblioteca surgiu no mesmo dia que o NEPSA foi inaugurado", sustenta Arlete; já pelo levantamento de Shirley, a inauguração foi no ano seguinte (2007).

E a "certidão de nascimento" da Setorial, que não existe? Há uma explicação, segundo Arlete: a biblioteca, justamente por ser setorial e ligada a um Centro, foi reconhecida automaticamente pela legislação relativa ao SisBi desde a data de implantação, nas dependências do NEPSA (atual NEPSA I) - daí não haver portaria ou resolução relativa à mesma.

De toda forma, num primeiro momento o espaço - com 235 metros quadrados, menor que o do antigo Destaque Bibliográfico - não se apresentava plenamente adequado para atender as necessidades de uma biblioteca, e foram feitas algumas adaptações. Com o passar dos anos, a biblioteca ganhou outras benfeitorias. 


Hoje, a "Setorial", com ambiente climatizado, está composta por dois pavimentos - o inferior, com o acervo (que em 2015 possuía cerca de 14.500 exemplares) e o setor administrativo; e o superior, com mesas e cabines para estudo. 

Pauta e produção: Joyce Ingrid // Texto original: Emerson Lucas // Fotos: Elindaelma Santos // Edição e texto final: Rogério Torquato