Entre a Grandeza Visual e a Simplicidade Narrativa
Pedro Henrique Araújo de Andrade
Dirigido por James Cameron, ‘Titanic’ permanece um marco do cinema comercial, combinando reconstrução histórica com melodrama romântico. O filme utiliza o naufrágio real de 1912 como pano de fundo para uma narrativa ficcional centrada no romance entre Rose (Kate Winslet), herdeira da elite sufocada pelas expectativas, e Jack (Leonardo DiCaprio), um artista pobre de espírito livre. Essa dicotomia social constitui o cerne temático, expondo criticamente as hierarquias da época, evidenciadas na segregação espacial a bordo e, sobretudo, na distribuição desigual dos salva-vidas durante o desastre.
Tecnicamente, a obra é notável. A reconstrução minuciosa do transatlântico, aliada aos efeitos visuais pioneiros (especialmente nas sequências do naufrágio), confere verossimilhança e impacto visceral. A direção de Cameron equilibra escala grandiosa com detalhes intimistas, como os contrastes entre a opulência da primeira classe e a precariedade dos conveses inferiores. As atuações de Winslet e DiCaprio, embora vinculadas a arquétipos, transcendem-nos por meio de química convincente e nuances emocionais.
Contudo, o roteiro sucumbe a simplificações problemáticas. O desenvolvimento do romance central apoia-se em convenções previsíveis, acelerando a conexão dos protagonistas em detrimento da profundidade psicológica. Os antagonistas, particularmente o noivo de Rose, Cal Hockley, são reduzidos a caricaturas da aristocracia vilã, perdendo oportunidades de complexidade. Licenças poéticas, como a icônica cena da proa (historicamente inacessível a passageiros) ou a polêmica lógica da porta flutuante, comprometem a coesão narrativa em favor do espetáculo.
A duração excessiva (3h14m) expõe fragilidades estruturais, com subtramas redundantes que não ampliam o tema central. Embora a crítica social seja válida, sua execução oscila entre o sutil (os planos sequenciais comparando refeições das classes) e o didático (os diálogos explícitos sobre liberdade).
Conclui-se que “Titanic” é um paradoxo: triunfa como façanha técnica e experiência sensorial, justificando seus 11 Oscars e recorde de bilheteria, mas falha como estudo de personagens ou narrativa refinada. Sua relevância cultural é inegável, porém mais como monumento à ambição cinematográfica que à profundidade artística.
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