quarta-feira, 6 de dezembro de 2017

Relato de uma Experiência

1.


O desafio de aplicar a teoria em um contexto de prática é o motor de existência da educação. A globalização neoliberal financia a propagação na mídia de massa de uma universidade a serviço do mercado, funcionalista e tecnicista. Essa visão míope e estratégica do mercado financia e influencia governos pouco dispostos ou subservientes a correlação de forças em continuar a mensurar o desenvolvimento intelectual por réguas quantitativas. Desta forma, um dos setores mais prejudicados por essa escolha política é a área de humanas.

Responsável em décadas passadas por pensar um projeto de Nação para o Brasil, hoje está relegada ao baixo investimento, o precário reconhecimento e a desvalorização intelectual. De modo mais objetivo, as políticas públicas desenvolvidas fortalecem exclusivamente setores tecnológicos e de engenharia à serviço das multinacionais; seus profissionais são acossados por indigentes fascistas acampados sob a ridícula alcunha de Escola Sem Partido; e nos seus espaços de atuação são obrigados a se submeterem a critérios de avaliação que deixariam orgulhosos os conselheiros econômicos do FMI.

Nesse contexto interno hostil, ainda resta a o desafio de devolver a sociedade como também esclarecer a mesma sobre a real função da universidade ancorada nos pilares da pesquisa, extensão e ensino. Tudo isso sem possuir capacidade de financiar e influenciar os meios de propagação simbólica em massa com o seu discurso. Dentro deste pequeno espaço reservado ao professor, resta, portanto, a liberdade de cátedra para explorar modelos alternativos de saber.


2.

Nos últimos anos, a profissão e o curso de jornalismo/comunicação social vem passando por mudanças profundas no seu corpus e ethos. O fim da obrigatoriedade do diploma, o encerramento das atividades de centenas de jornais tradicionais e a ausência de uma regulamentação econômica que evite a expansão de monopólios informativos merecem uma reflexão ainda mais complexa em tempos de internet para não transformar o oficio em uma terra de ninguém. Ou, com profetizou Pullitzer, com o tempo, corremos o risco de criar uma sociedade cínica e vil à imagem e semelhança de sua mídia. O que não estamos muito distantes.

Para tanto, cabe não somente repensar, como também ressaltar a disciplina em Teorias da Comunicação. O pensamento abstrato não surge do nada para explicar coisa alguma. É fruto de observações e pesquisas intensas sobre como se reflete no agir em sociedade. A preocupação com a manipulação dos fatos, a representação das identidades, os usos que fazemos das mídias, os discursos dos meios, a produção de sentidos e as práticas sociais que engendram serão fios condutores à longo-prazo para uma construção social positiva ou negativa. A teoria não pode ser deslocada da realidade; ao contrário, é seu dever dialogar com ela, com o imediato. De outro modo, não existe razão de ser.

Nos anos 60, esta preocupação do diálogo com a realidade levou inúmeros pesquisadores à práxis. O desenvolvimento do subdesenvolvimento em território latino-americano provocou uma onda revolucionária de transformação imediata da realidade social. O campo da comunicação não ficou incólume: Paulo Freire (Brasil), Mário Kaplun (Uruguai), Armand Mattelart (Chile), Luis Beltrán (Bolívia), Juan Diáz Bordernave (Paraguai), entre outros desenvolveram métodos que empoderassem os sem-mídia, principalmente os excluídos do campo e da cidade. Os governos autoritários impediram a tempo que esses sujeitos lograssem sucesso, mas a história, por ora, não se encerrou.


3.

A pluralidade renovadora de vozes e experiências que compõe a realidade em sala de aula conduz à inevitável reflexão pedagógica de Paulo Freire sobre o professor que aprende com os educandos. Multidisciplinar por natureza, o campo da comunicação carece de um objeto de pesquisa puro, porém abre espaço para uma miríade de interpretações transdisciplinar sobre um fato. Afinal, um fato se define pelo olhar do outro.

Com o estágio docência, orientado pelo professor Dr. Marcelo Bolshaw, tive a oportunidade de aplicar a teoria na prática. O momento da pós-graduação é, entre outros postulados, o de refinar o raciocínio crítico com o objetivo de formar-se um sujeito com as competências mínimas necessárias que facilite o compartilhamento de saberes. Reconheço que a Universidade não é o único nem o mais indicado local a se desenvolver essas habilidades, porém, na realidade da qual estou inserido, não seria prudente menosprezar essas diretrizes.

Dialogar as teorias da comunicação com a realidade concreta foi o desafio proposto: a) identificar no espaço-tempo a construção/invenção da nossa realidade cultural, vítima da modernidade, o silenciamento dos povos originários e escravizados que nos caracterizam como um país de massas, de tal forma que reproduz-se nos discursos e representações simbólicas/midiáticas a opressão e a violência de um passado que teima em ser a nossa sina; b) explorar os talentos criativos da turma do curso de Comunicação Social/Audiovisual-UFRN na disciplina em História e Teoria da Comunicação II.

Os trabalhos desenvolvidos abaixo representam um primeiro passo em direção à este objetivo, o de não se deixar resignar-se. Para a partir daí, planejar os próximos passos em busca de estratégias que visem bloquear o desenvolvimento do subdesenvolvimento e superar de forma massiva a nova colonização que hoje atende pelo nome de Globalização. A comunicação, a cultura e a educação são instrumentos de emancipação social, porém, se deixadas nas mãos do status quo, irão representar somente a manutenção do sistema soft de escravidão e o estimulo do desejo pela servidão. Que sirvam de um alerta sobre onde nós estamos e para onde queremos ir.

Alisson Gomes Callado
Mestrando em Estudos da Mídia-UFRN

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