quarta-feira, 16 de fevereiro de 2022

Justiça

Uma palavra, vários significados

 Pollyanna Ferreira Avelino

No curso de Direito, ensina-se que o Estado chamou para si o direito de punir, tendo também o dever de promover justiça. Mas o que acontece quando o Estado e a Justiça, sua instituição, falham? Quando a pena atribuída a quem cometeu o crime é considerada como insuficiente? Quando a Justiça, que deveria ser imparcial, revela-se indulgente com alguns e discriminatória com outros? Quando a injustiça é realizada ao invés da justiça, anseio tão humano? Estas e outras questões são abordadas pela minissérie Justiça, escrita por Manuela Dias e exibida pela Globo em 2016.

Nela, vemos Elisa (Débora Bloch) disposta a matar Vicente (Jesuíta Barbosa), o ex-noivo e assassino de sua filha que cumpriu somente sete anos de pena pelo crime. Entretanto, ela entra em conflito quando se permite humanizá-lo, quando o enxerga como alguém que também sofreu com suas ações. Acompanhamos também desavenças entre vizinhos que culminam na acusação falsa realizada por Douglas (Enrique Días), policial, contra Fátima (Adriana Esteves), doméstica e mãe de dois filhos pequenos, que é condenada injustamente.

Sozinhos, sete anos depois, ambos voltam a conviver e precisam resolver as questões do passado. Assistimos ainda a história de Rose (Jéssica Ellen) e Débora (Luisa Arraes), duas amigas de infância que, na posse de drogas ilícitas, recebem tratamento discriminatório da polícia em razão do racismo institucionalizado. Rose é presa e Débora sai impune, mas é estuprada depois e conta com o auxílio da amiga para obter justiça. Por fim, vemos a história de Maurício (Cauã Raymond), cuja esposa, Beatriz (Marjorie Estiano), é atropelada e fica tetraplégica. O criminoso sai impune, candidatando-se a um cargo político anos depois, mas Maurício é preso por ter auxiliado Beatriz em sua eutanásia.

Ao assistir a minissérie, é interessante observar que, quando a Justiça falha como instituição, o conceito de justiça ganha conteúdos diferentes. Vingança, reconciliação, recomeço etc. Ademais, a maioria dos personagens são apresentados como humanos, todos sujeitos a erros e acertos, distantes de um maniqueísmo possível em razão do tema da obra, o que é um ponto positivo. Outro seria a ambientação da produção, que ocorre no Recife, longe do tradicional eixo Rio-São Paulo. Ainda que o enredo seja adequado para o Brasil como um todo, ver outro local em tela confere uma sensação de novidade, que também se manifesta na trilha sonora. 

Por outro lado, o entrelaçamento das histórias, que se passam no mesmo dia, simultaneamente, e que é demonstrado por meio da repetição de cenas em pontos de vista diferentes, pode se tornar cansativo para quem assiste. No entanto, não se torna confuso. Especificamente, o tema do racismo se perde no decorrer da trama de Rose e Débora. Seria interessante ver mais desdobramentos. Pessoalmente, as menções ao crime de Vicente, considerado como passional, são irritantes. Servem para humanizá-lo e a classificação é estabelecida pela lei. Porém, o rótulo do passional pode ser uma rota de fuga para um debate mais profundo sobre o machismo, a verdadeira raiz do problema. 

No geral, Justiça é uma minissérie que pode conduzir o telespectador a reflexões importantes, dada a realidade brasileira e os clamores de longa data em torno das falhas da Justiça. Seus vinte episódios prendem a atenção e, em especial, a justiça entendida como reconciliação pode ser uma novidade para quem a enxerga por um prisma mais punitivista. Enfim, vale a pena conferir.

Breaking Bad

Liberando o mal

  DENIS VITOR DOS SANTOS VIEIRA

      Vince Gilligan, um dos produtores da célebre série de Chris Carter dos anos de 1990, Arquivo X,  e, um dos criadores de seu Spin Off, que foi além das teorias de conspiração, alcançando o status de  profético, The Lone Gunmen (vide o episódio piloto “The Pilote”, que fez sua estreia em março do fatídico ano de 2001 precedendo os funestos acontecimentos em 11/11), nos apresenta em Breaking Bad, a história de Walter White, um químico, colaborador de um prêmio Nobel que escolheu ser um pacato professor do ensino médio na cidade de Albuquerque, no estado fronteiriço do  Novo México, que descobre ter câncer terminal e, no intuito de livrar sua família (a esposa ainda grávida e seu filho com paralisia cerebral parcial) de dificuldades financeiras futura, decide deixar de legado  alguma segurança financeira como herança, ainda que tenha que quebrar as leis e se torna um criminoso, usando seus conhecimentos em química para produzir droga sintética, metafetamina. 

  A  grosso modo parece apenas mais uma história sobre a fronteira com o México e tráfico de drogas , o que  veremos que também o é, mas de maneira íntima, percorrendo seu mundo à partir da brutalidade da marginalidade, entre  viciados, repressão e traficantes varejistas, de onde apenas terminam os tentáculos do monstro, percorrendo sua estrutura, entre intermediários até os grandes magnatas das operações,  os “barões” que movimentam o verdadeiro império do  dinheiro sujo. 

  Porém, na realidade, a obra de Galligan acaba por ser a história sobre vaidade reprimida, e, de como essa pode transformar um sujeito, pacato, honesto em uma criatura inescrupulosa e de meticulosidade impiedosa.  Essa acaba por ser a história visceral do protagonista-antagonista de Gillian, espetacularmente personificado pelo ator Bryan Cranston (que também é um dos produtores) com uma atuação convincente, digna de empatia (e repulsa) emocional por parte do espectador, colabora de maneira sublime com a diegese da série, bem como o jovem ator  Aaron Paul,  cuja interpretação foi  tão intensa e  importante  quanto a Cranston (quiçá até mais importante , já que foi capaz de mudar radicalmente o projeto da  trama inicial da série, na qual seu personagem morreria na primeira temporada) Aaron, vivencia na pele de Jesse Pinkman, um  consumidor recreativo de drogas e uma espécie de pequeno traficante “bom-vivant” que produz  metafetamina de qualidade duvidosa, até sua aliança com Walter White, que definitivamente mudará a qualidade de seu produto em contraste com a qualidade de sua  vida. Vale ressaltar que  atuação, todo elenco da série colabora para uma unidade verossímil, desde dos atores e atrizes do núcleo de Walter White, como seu cunhado xenofóbico, o agente Hank Schrader do DEA (a divisão antinarcóticos federal estadunidense) interpretado por Dean Norris e sua esposa  Marie Schrader ,interpretada pela atriz Betsy Brandt,  um  retrato fidedigno de  “gente do bem”; além de claro, a severa esposa de Walter White, Skyler, vivenciada por Anna Gunn e seu filho Walter Jr, interpretado por RJ Mitte, ator que na vida real tem paralisia cerebral. Ademais, outros personagens coadjuvantes e núcleos transitórios da série compuseram as temporadas de Breaking Bad com tamanho protagonismo e densidade que ganharam notoriedade e empatia do público, como o do Advogado Saul Goodman, o empreendedor Gustavo Fring e a família Salamanca, a ponto de estrearem uma série  spin off. 

   O arco dramático da série Breaking Bad se dá em cinco temporadas, desde a apresentação do personagem Walter White  e sua “morte metafórica” em meio ao desespero diante de  sua  iminente derrota no jogo do  tudo ou nada, na qual  é marcada pela   puxada de um gatilho que deflagra a libertação do mal no episódio piloto, ao desenvolvimento de seu álter ego, Heisenberg, o lado obscuro que ganha vida à partir da segunda temporada a ponto de ignorar a pretensa consideração e segurança que Walter White desejava legar aos seus entes queridos, seus objetivos iniciais. Nos seguimentos adiante do arco, a notoriedade de Heisenberg afaga sua vaidade, o potencial de liberdade ilimitada oriunda de uma vida criminal faz vicejar a face oculta de  um homem que outrora era apenas um mero professor,  paciente terminal  digno de pena, transformando-o em um sujeito cujo regozijo é o poder exteriorizado na  prática impiedosa e engenhosa de maldade justificada na luta por acúmulo de dinheiro, até o fim de sua jornada, onde o destino o fará revelar quem realmente “prevalecerá” .    

     É  inevitável o reconhecimento do “DNA” de  Dr Jekyll e Mr Hide fruto da obra literária de Robert Luis Steveson, talvez esse seja um legado referencial,  consciente ou inconsciente, para todas as tramas seguintes à sua obra, cujo ponto central seja o duelo interior de um indivíduo na personificação entre  “o bem e o mal ” de uma dupla personalidade. Contudo, a criação de Gilligan se mostra uma obra digna de reverência como peça audiovisual, sua transposição temporal de um homem em um laboratório e a liberação do mal através da experiência química para a nossa contemporaneidade por via de uma série televisiva foi realmente bem elaborada. Desde a fotografia do consagrado  John Toll, que assina a série na  primeira temporada a ponto de direcioná-la nas temporadas seguintes, bem como a de Michael Slovis, que assina as temporadas seguintes, compuseram cenas impactantes, principalmente nos grandes planos com a utilização criativa das grandes angulares; passando pelo roteiro, muito bem intrincado, quase  sem pontas soltas que foi  composto por ganchos verossímeis, obra de uma sala de  roteiristas que contou com a  assinatura de Moira Walley-Beckett , Thomas Schnauz , Patty Lin entre outros, além de Gilligan, criador da série; quanto a trilha sonora essa é repleta de obras de músicos alternativos, como The Black Seeds, Ana Tijoux, Glen Phillips e tantos mais , além de clássicos da cultura estadunidense que embalam a série tornando-a notável e interessante.  

   Enfim, professor e o monstro de Gilligan trazem uma boa reflexão contemporânea quanto ao problema das drogas, seu uso recreativo, o vício, a repressão e suas associações, e,  principalmente, quanto ao ego, a moralidade e amoralidade nas relações  sociais, temas esses, abordados de maneira prismática, tornando a série Breaking Bad  pertinente, principalmente aos dias atuais. 

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2022

How i ...

 


COMO EU CONHECI MINHA NOVA SÉRIE FAVORITA


MARIA CLARA DE LIMA SOUZA

 

O ano era 2005, eu era uma criança e no ano anterior uma das maiores séries de comédia havia chegado ao fim. Um sucesso estrondoso até hoje, Friends terminava depois de marcar uma geração inteira de jovens adultos, deixando espaço para o surgimento de uma nova série que desempenhasse esse papel para os jovens dos anos 2000. How I Met Your Mother acompanhava Ted Mosby, um jovem arquiteto, que passa a contar para seus filhos a história de como conheceu a mãe deles, passando por histórias de seu grupo de amigos e da vida de um homem solteiro em Nova York. Mas não é sobre essas séries que vamos falar hoje.

Assim como Friends deixou espaço para uma nova série sobre jovens adultos em Nova York, How I Met Your Mother também deixou, e partindo desse pressuposto foi idealizada uma nova versão dessa última, um reboot – a mesma premissa da série original, porém com personagens e histórias diferentes. E agora em 2022 ganhamos a série How I Met Your Father, protagonizada pela atriz e cantora Hillary Duff (12 é demais, Lizzie Mcguire), que acompanha a vida de Sophie, uma jovem fotógrafa que mora em Nova York e, já em 2050, começa a contar para seu filho como conheceu o pai dele, passando pela vida de seu grupo de amigos e nos mostrando como é – ou no caso da série, era – a vida de uma mulher solteira na década de 2020.

A série estreou em janeiro de 2022 pela plataforma de streaming Hulu nos Estados Unidos, e chegará no Brasil em março através do Star+. Mesmo sofrendo muitas críticas dos amantes da série original que inspirou essa nova história, How I Met Your Father se mostrou uma série bastante original e diferente da sua inspiração, tendo como parecido apenas o local onde se passa e a forma como a narrativa é conduzida.

Contada através de flashbacks da própria Sophie, agora mais velha, a série consegue trazer o protagonismo feminino de forma natural e assim atualizar alguns arquétipos presentes na série original. Sophie, diferente de Ted, aceita a situação onde está e apesar de querer encontrar um amor não está desesperada, o que cria um ótimo contraponto com Jesse que, após ser rejeitado ao pedir a namorada em casamento, se fecha totalmente aos relacionamentos amorosos. Temos também Valentina, melhor amiga da protagonista, é uma mulher sexualmente livre e que em nenhum momento é julgada por isso, além da irmã de jesse, Ellen, uma mulher lésbica que veio do interior para tentar conhecer o amor da sua vida na cidade.

O ano é 2022, e agora eu sou uma jovem adulta que, mesmo tendo assistido Friends e How I Met Your Mother, agora sinto que minha geração tem uma série com o potencial para ser chamada de nossa. Até o momento só foram lançados 5 episódios da primeira temporada, com 10 episódios previstos, e apesar de não sabermos a reação final do público, a série tem uma boa estrutura narrativa, com um formato que com certeza nos prende no mistério de “Quem é o pai?” e personagens cativantes, que nos fazem sentir como se estivéssemos lá, passando pelas situações junto com a Sophie.

GOT

 


O controverso final da série mais pirateada da história

LUAN DE SOUSA FIGUEREDO

Game of Thrones é uma série criada por David Benioff e D. B. Weiss, baseada nos livros das Crônicas de Gelo e Fogo de George R. R. Martin. Foi transmitida pelo canal HBO entre abril de 2011 e maio de 2019. A história cobriu, ao longo das cinco primeiras temporadas, o enredo contado nos livros já publicados das "Crônicas".. A intenção do escritor é publicar sete livros, o último lançado data de 2012. Tanto R. R. Martin, quanto D&D (apelido dado a dupla de showrunners de Game of Thrones) acreditaram que Martin conseguiria finalizar a saga a tempo de adaptar todo material, um livro por temporada. 

A característica lentidão de R. R. Martin, combinados com longos períodos de bloqueio criativo e agenda de compromissos intensa, culminou no que no início não parecia óbvio, e aqui nenhuma culpa pode ser atribuída ao autor, este é o perigo de adaptar-se uma obra ainda em andamento: a série inevitavelmente iria alcançar os livros. Aconteceu na quinta temporada. Os produtores da série se viram obrigados a continuar a escrever uma história sobre a qual não eram os autores originais. 

Conheciam daquele mundo com a palma das mãos, mas não fora criação deles. E ficou evidente na tela. O desconforto dos produtores (a partir da sexta temporada, os showrunners D&D passaram a escrever todo o roteiro da série) ao lidar com aquele universo tão complexo ficou escancarado. O material provido por R. R. Martin misturava uma ubiquidade de virtudes em um só universo de fantasia. 

A limitação dos produtores era visível. Mesmo assim, com todo o material adiantado nas longas conversas entre eles e R. R. Martin, foi possível criar uma sexta temporada bastante sólida, mesmo com a falta do material original para adaptação. Game of Thrones é uma das poucas séries que entrará para história por dois motivos diferentes: pelo fenômeno que foi e pelo desapontamento dos fãs com o final. Feito parecido só tenha sido alcançado por Lost, que foi igualmente revolucionária e decepcionante.

O problema de finais ruins é que eles arruínam a capacidade de re-assistir um determinado produto. Porque perder horas e horas revendo uma história a qual o desfecho é, quase que universalmente, considerado insatisfatório. Todas as cenas marcantes, as atuações memoráveis, os plots twists são prontamente jogados no lixo pela falta de habilidade em concluir um enredo. 

Game of Thrones foi durante anos a série mais relevante da sua época e se não fosse pelas suas duas últimas temporadas, facilmente seria considerada a melhor série de todos os tempos. Com o passar das temporadas a série cresceu em termos visuais e cenográficos e diminuiu a sua capacidade de mise en scène. Na reta final "subiu de interesse e desceu de nível".

quarta-feira, 9 de fevereiro de 2022

HACKS


 O CONFLITO GERACIONAL E AS MULHERES NA INDÚSTRIA DO ENTRETENIMENTO

RODRIGO COLLINETTI FIORIN 

Partindo de uma premissa simples, mas cujos desdobramentos envolvem o espectador à medida que a narrativa avança, Hacks (EUA, 2021), série de comédia original do serviço de streaming HBO MAX, é um exemplo contemporâneo do quão possível é fazer humor de forma inteligente, atualizada e extremamente engraçada. A série traz a veterana da comédia Deborah Vance (brilhantemente interpretada pela também veterana Jean Smart, num papel que finalmente reconhece sua força e grandeza) em um dilema. Seu espetáculo de comédia fixo em um hotel de Las Vegas está ameaçado em virtude da necessidade dos proprietários em limpar a agenda do local para encaixar atrações mais contemporâneas, haja vista que o humor de Deborah é tido como datado. Por essa razão, seu empresário Jimmy (Paul W. Downs) lhe sugere a contratação de uma aspirante da comédia, sua também cliente Ava Daniels (papel de Hannah Einbinder, igualmente brilhante em cena). Ava, por sua vez, está sofrendo as consequências de um “cancelamento” sofrido na internet em virtude de uma piada feita com o filho de um congressista e assistindo seus sonhos como escritora de comédia ruírem aos poucos.

O primeiro encontro das duas, no entanto, é desastroso. O choque inicial entre elas é, antes de mais nada, geracional. Deborah acha Ava insolente, inexperiente e sem referências, enquanto Ava acha Deborah rude, datada e arrogante. E o que tinha tudo para dar errado, contudo, se torna paulatinamente a redenção de ambas.

A série explora a problemática dinâmica da relação entre as duas ao passo em que apresenta, aos poucos, suas reais motivações e as causas de suas atuais posturas. Embora Deborah seja a chefe imediata de Ava, o que a coloca numa posição hipossuficiente diante da veterana, os roteiristas exploram perfeitamente o mutualismo fundamental da relação delas, tornando claro o quão dependentes elas são uma da outra.

Atravessando temas espinhosos e denunciando o machismo na indústria cultural de modo inteligente, ao mostrar como funcionava a indústria na juventude de Deborah e como pouca coisa mudou desde então, muito embora ela possua uma carreira extremamente próspera e consolidada, a série acerta ao não se apoiar em maniqueísmos baratos, deixando claro que nada na vida é “preto no branco”, mas sim uma escala de cinza, com minúcias e especificidades, pois ninguém é de integralmente mau ou totalmente bom.

O ponto alto da série é a maneira como o conflito geracional entre as protagonistas é explorado dentro do desenvolvimento da relação delas. A química entre as duas atrizes salta aos olhos até do espectador mais distraído e a maneira como a construção das personagens é feita faz com que o público as entenda e se identifique com elas. Ao passo em que a dinâmica da relação progride, não há quem não torça pela amizade das protagonistas e a solidificação do afeto entre elas.

Filmada em câmera única, a cinematografia é muito bem construída e de uma elegância ímpar, com longos takes externos, gravados no deserto de Las Vegas, a série consegue transmitir a repulsa que certos personagens sentem pela cidade, embora esta seja visualmente agradável. A trilha sonora e a edição de som são outros grandes acertos da produção.

Aclamada tanto pelo público quanto pela crítica, a série foi reconhecida como Melhor Série de Comédia no Globo de Ouro de 2021 e rendeu um Emmy e um Globo de Ouro de melhor atriz para Jean Smart, além de indicações em ambos os prêmios na mesma categoria para Hannah Einbinder.

Felizmente renovada para mais uma temporada, a série trata de temas contemporâneos como o ageísmo, o machismo, o abuso de substâncias químicas e até mesmo suicídio de forma leve e extremamente inteligente. Graças ao roteiro afiado dos criadores Lucia Aniello, Paul W. Downs e Jen Statsky, que explora o conflito geracional entre as duas protagonistas de forma majestosa, Hacks é um grande acerto dentro do catálogo da HBO MAX e uma série obrigatória para quem gosta de entretenimento de qualidade, com atuações impecáveis, texto ágil e humor inteligente.

lost in space

 


LUCAS RIBEIRO


Uma das séries que mais me conquistou nos últimos anos desde o primeiro episódio, sem dúvida foi Perdidos no Espaço (ou Lost in Space), recentemente cancelada pela Netflix, com apenas três temporadas. Criada e comandada por Zack Estrin (showrunner e produtor executivo), a narrativa se inicia após um pouso forçado em um planeta desconhecido, onde a família Robinson tenta sobreviver aos perigos que encontra nesse novo mundo. Porém, essa apenas é a trama dos primeiros episódios: Com expedições para um planeta mais adequado para a existência humana (Alpha Centauri), as poucas famílias aprovadas para o projeto têm a missão de contribuir para o desenvolvimento dessa nova civilização. Os protagonistas, a família Robinson, constantemente se deparam com novas aventuras e desafios, almejando sempre seu destino final. O foco principal dessa análise será a última temporada: Se mantém o nível das anteriores e se cumpre a difícil tarefa de concluir com sucesso a jornada de nossos queridos personagens.

Apesar de muitos fatores essenciais estarem de volta (visuais continuam impressionantes, efeitos especiais, design de produção, figurino, trilha sonora), é notável que alguns não se fazem presentes o suficiente: Enquanto as duas primeiras temporadas apresentavam diversos obstáculos para a família Robinson, assim como suas soluções, a presença da lógica sempre foi um fator imprescindível para o entendimento do público do que estava acontecendo, além de cativar e vender os personagens como brilhantes cientistas. Aqui não há lógica o suficiente para fazer a audiência entender e se importar com as ameaças, nem como elas são “cientificamente solucionadas”. O que é uma pena porque até então não havia problema algum em trazer aspectos científicos plausíveis para o roteiro. Como consequência temos uma temporada mais relaxada, com resoluções ao acaso, e sem se dar tanto o trabalho em dar continuidade a lógica narrativa.

Percebe-se também a redução significativa das sequências de ação, outra marca registrada que até então unia adrenalina com excelentes efeitos visuais. Às vezes a impressão era que a Netflix limitou alguns aspectos da série, por ser a última temporada É bastante comum os responsáveis darem um orçamento bem menor por saber que não haverá uma renovação, então o showrunner só pode ir até certo ponto com a história, não é mesmo?

Um outro fator que vale ser enaltecido é o Will (o famoso Will Robinson, interpretado por Maxwell Jenkins), porque enquanto, em anos anteriores, contribuía bastante com uma solução em grupo, com o resto dos familiares, aqui nota-se um forte e constante complexo de herói. Múltiplas vezes o personagem ignora as consequências mortais dos perigos (no caso os robôs perseguindo eles), e ao invés de promover uma discussão em grupo (o que era feito frequentemente nas temporadas anteriores) aqui ele já vai direto para última solução, supondo que é a única que vai dar certo: O seu sacrifício! Dar a vida para salvar a família. Mesmo sendo o mais novo, uma criança/pré-adolescente, anteriormente (nas duas temporadas passadas) era ainda mais novo e sempre agiu em grupo, com os pais/irmãs, por saber que, no final das contas haveria uma solução. Aqui toda hora sua segurança é colocada em risco por ter a certeza de que o seu sacrifício é o equivalente a segurança e paz das outras pessoas, o que definitivamente é um comportamento problemático e que chama atenção. Às vezes era um perigo tão absurdo que estava se submetendo, que acabava afetando minha visão do personagem, tornando-o menos carismático, por já não concordar mais com o que ele estava fazendo.

Continuando na categoria personagens, Taylor Russel interpreta Judy Robinson e mais uma vez se destaca. Na última vez que a vimos, recebeu uma responsabilidade enorme: Ser a capitã da Júpiter (nave) com todas as crianças, incluindo seus irmãos, em uma fuga de última hora. E por boa parte da narrativa vemos as consequências disso, pois ganha bem mais destaque, sendo vista como uma líder competente e responsável. Parte disso é mérito da atriz, que faz um ótimo trabalho vendendo a preocupação da personagem em proteger todo mundo. Um bom exemplo se dá no começo do primeiro episódio, com um alerta de emergência contra meteoros entrando na atmosfera sendo emitido, e sua urgência em trazer todas as crianças para o abrigo subterrâneo em segurança. Em momentos como esse percebe-se a responsabilidade que ela carrega nesse posto. A posição de líder lhe serviu muito bem, um ótimo desfecho para sua jornada.

Válido fazer uma rápida menção honrosa pra Parker Posey, que faz a Dra Smith. Em anos passados se provou uma verdadeira anti-heroína, ou seja, não fazendo algo puramente pelo benefício ou malefício dos outros, mas sim o que lhe convém. O que a torna ainda mais interessante agora é que, depois de quase um ano naquele planeta tropical, sendo a única adulta com todas aquelas crianças, parece que isso a mudou, desde então está diferente: Se importa mais com os Robinsons, principalmente os filhos, reflete mais sobre suas ações passadas, e as consequências que batem à porta. Mesmo que infelizmente não tenhamos visto esse desenvolvimento, essa transição, ela já começou a temporada sendo um ser humano mais decente. Apesar de tudo, seu desfecho foi bem satisfatório, lidando com os dilemas de suas ações em temporadas passadas ao decidir ir para cadeia. No geral foi bem apropriado.

Vale lembrar que a terceira e última temporada, ao contrário das outras que tem 10, aqui tem 8 episódios, cada um variando entre 38 minutos e 1h aproximadamente.

No geral, o final de Perdidos no Espaço é bem agridoce, não fazendo jus a jornada que tivemos esse tempo todo. Acabou deixando a desejar, especialmente porque, na tentativa de resolver algumas questões estabelecidas previamente, acaba gerando ainda mais pontas soltas. O desfecho dos Robinsons, no entanto, foi feliz, e esperado. Em relação a isso fico satisfeito. No modo como todos (juntos) encerraram a jornada. Pessoalmente acredito fortemente que ainda há sim como fazer mais temporadas, é uma série que tem muito o que explorar, ainda mais com a relação pacífica oficialmente estabelecida entre os robôs e humanos, há como abordar mais isso, mas ao que parece esse é o fim. Porém, nunca se sabe.

Maid

ISABELA VITÓRIA RODRIGUES FELIX


Maid, minissérie original da Netflix de dez episódios lançada 2021, é baseada em fatos reais e conta uma história que emociona do início ao fim. Inspirada na vida de Stephanie Land, a série acompanha a trajetória de Alex, uma jovem mãe vítima de violência doméstica que abandona o trailer onde vive com o namorado em busca de uma vida melhor para ela e a filha.

Sozinha, sem dinheiro e qualquer apoio familiar, Alex consegue reunir coragem para se lançar em uma longa jornada em busca de independência e segurança. A protagonista tenta ganhar a vida trabalhando como empregada doméstica, mas o péssimo salário mal permite que mãe e filha consigam viver decentemente. Sobrecarregada com as dificuldades encontradas pelo caminho, Alex, por vezes, consegue recarregar suas forças em refúgios, como um abrigo para vítimas de violência doméstica ou em suas curtas estadias em casas de pessoas que tem a intenção de ajudar- mesmo que esperando algo em troca. O enredo avança de forma espetacular, ele captura os diversos aspectos da fuga de um relacionamento abusivo e ainda viaja por todas as nuances psicológicas que envolvem os personagens. A jornada de reconhecimento por parte da protagonista sobre todas as violências vividas dentro de seu relacionamento torna-se um momento de aprendizado e, de certa forma, tranquilidade para inúmeras mulheres.

Fora isso, o relacionamento entre mãe, filha e neta é realmente intrigante. A personagem principal, além de enfrentar seus próprios desafios, precisa lidar com os problemas da mãe com transtorno bipolar não diagnosticado. Curiosamente, Alex, vivida por Margaret Qualley, e sua mãe Paula, interpretada por Andie MacDowell, também são mãe e filha na vida real. A relação pessoal das duas transparece em suas atuações. Margaret, famosa por ter aparecido no filme Era uma vez em Hollywood, de Quentin Tarantino, impressiona com a delicadeza e emoção de sua performance, especialmente pela relação de afeto que ela constrói com a atriz de cinco anos, Rylea Nevaeh, que interpreta sua filha Maddy. Além disso, Andie MacDowell, conhecida pelos seus papéis em comédias românticas dos anos 90, surpreende ao entregar uma personagem tão complexa e com tantos dramas psicológicos como Paula.

Já a parte técnica é realmente merecedora de aplausos. Desde o roteiro bem elaborado até a trilha sonora original e a belíssima fotografia que acompanha perfeitamente a trajetória das personagens. Porém, o ponto de destaque na obra é certamente o figurino pouco trabalhado e  até um pouco desleixado. Aqui, os personagens são representados como pessoas reais e o foco não é na vaidade e sim na beleza da simplicidade. 

Maid é uma obra impactante e difícil de se esquecer. Ainda que Alex nunca desista, a experiência de assistir a série é extremamente agonizante e dolorosa. Contudo, acompanhar a força da protagonista, que batalha sozinha por um futuro melhor, é incrivelmente inspirador e ainda mais recompensador quando a jovem é finalmente agraciada pela vida ao final da série. A trama é muito verdadeira e em momento algum romantiza o sofrimento. A violência doméstica, o alcoolismo e os transtornos mentais são problemas sérios que afligem a sociedade e a produção conseguiu abordar tais problemáticas com muita responsabilidade e respeito. Para aqueles que se interessem por dramas de arrancar lágrimas, Maid é certamente uma ótima indicação.

The White Lotus

 


A Sátira ao Privilégio de Raça e Classe

Anna Giulia Canestraro

A série de 2021 de comédia dramática da HBO acompanha três núcleos de hóspedes do resort de luxo White Lotus, no Havaí, além do núcleo dos funcionários. Entre esses hóspedes temos uma família que discute o politicamente correto enquanto usufrui do seu privilégio branco, um casal em lua de mel que descobre – tarde demais – que não tem muito em comum além da relação de interesse de esposa-troféu e herdeiro e uma mulher extravagante e carente de meia idade. Os personagens são apresentados, mas não passam por grande aprofundamento, o que leva a acreditar que a intenção é construir personagens genéricos, uma caricatura da burguesia.

The White Lotus se desenrola então com cada um desses núcleos acontecendo simultaneamente e eventualmente se cruzando. E cruzando também com a trajetória dos funcionários, em especial, o gerente Armond (Murray Bartlett) e os funcionários Belinda (Natasha Rothwell) e Kai (Kekoa Kekumano), que exercem um importante papel na crítica da série, pois, na tentativa tanto de contrariar as vontades dos hóspedes, quanto de se aproximar e acreditar em falsas e egocêntricas promessas sofrem consequências que os levam a ter destinos trágicos em detrimento das ações dos hóspedes para com eles, enquanto os culpados seguem com sua realidade privilegiada intacta.

Interessante notar que os personagens apresentados como mais humildes, que seriam os funcionários, a esposa bancada pela família do marido e a amiga latina da filha da família principal não têm nome completo na série. Apesar de ser implícito que possuiriam sobrenomes, são chamados durante toda a narrativa apenas de Armond, Belinda, Kai, Rachel e Paula, enquanto os demais são apresentados logo de início pelos sobrenomes Mossbacher, Patton e McQuoid. Esta também pode ser considerada uma sútil crítica à desigualdade social, uma vez que chamar alguém pelo sobrenome culturalmente é uma indicação de respeito, além de, nesse caso, indicar também uma herança social, pois fica entendido que todos os hóspedes são provenientes de famílias ricas e que os privilégios os acompanhariam há gerações – e por gerações. Já funcionários e acompanhantes desses herdeiros não são tratados como merecedores do mesmo prestígio social, refletindo uma realidade da sociedade.

O roteiro é repleto dessas sutis críticas e consegue provocar ora vergonha alheia, ora comoção, ora raiva. Provando assim que mesmo em um enredo onde aparentemente não haveria muito “caldo para espremer” (a rotina de pessoas em um resort indo à praia, à piscina, jantando, frequentando o bar do hotel e repetindo tudo de novo no dia seguinte) um roteiro cômico e afiado na ironia pode dar outro sentido e tornar a narrativa envolvente.

A trilha sonora também tem a sua responsabilidade por cativar a atenção do espectador. Isso porque ela é composta por instrumentos agudos discordantes em constante aceleração misturados com gritos de animais, criando uma atmosfera de suspense, mesmo a série sendo cômico-dramática. O diretor da série descreve essa atmosfera como a de um “sacrifício humano” e pode-se acreditar que assim tenha sido feito para acentuar a situação de exploração de uma classe sobre a outra, de forma agoniante para esta segunda e gerar essa sensação de ausência de possibilidade de escapatória.

A obra é assinada por Mike White, conhecido por Dawson’s Creek, Freaks and Geeks e Escola de Rock. Além dele, a série também conta com elenco de peso, como Steve Zahn (Capitão Fantástico), Connie Britton (American Horror Story), Jennifer Coolidge (Legalmente Loira) e Sydney Sweeney (Euphoria). Elenco esse que, não atoa, mistura nomes famosos da comédia e do drama, bem como a mistura que The White Lotus propõe e executa com sucesso.



Bridgerton

 

White problems com diversidade

Marina Nobre da Rocha Viégas

Caro leitor...” É com essa frase de teor misterioso, eloquente e levemente cômico que a personagem-narradora Lady Whistledown introduz a primeira temporada de Bridgerton, adaptação literária da Netflix a partir de uma série de livros escritos por Julia Quinn, à moda de Gossip Girl, outra famosa série. E com isso, Bridgerton introduz a volta de séries sobre elite e fofocas desde a última temporada de Gossip Girl, mas com teor um tanto romântico e catártico, isto é, Bridgerton veio com o propósito em prender tanto os amantes dos livros de Quinn quanto os demais espectadores às telas, sobretudo no que se refere à inclusão racial à série, indo de encontro às características originais de alguns dos personagens dos livros. Em síntese, o showrunner Chris Van Dusen resolveu criar um universo alternativo a partir da inclusão de atores negros à série, o que lhe renderia uma série de questionamentos e, de certa forma, um avalanche de opiniões diversas e antagônicas.

Escrita por Chris Van Dusen e produzida pela Shondaland (de Shonda Rhimes), que por sua vez produziu séries de sucesso como Grey’s Anatomy, Scandal e a ainda inédita Inventing Anna (que será exibida em 2022), Bridgerton chamou atenção do público pelo simples fato: a série incluiu atores negros, o que de longe despertou e dividiu opiniões. Em outras palavras, a inclusão de atores negros, como Regé-Jean Page, Adjoa Andor e Golda Rosheuvel, provocou uma divisão de opiniões: enquanto que uns aprovaram a escolha destes atores para os personagens originalmente brancos devido à sua excelente performance, outros, especialmente leitores – aos extremos – de Julia Quinn, criticaram esta escolha por motivo temporal – a fim de se situar, a trama se passa na Inglaterra Regencial – e autoral, isto é, numa época em que negros, asiáticos e índios eram subjugados pelos brancos, não havia representatividade do tipo, ainda mais o lugar na sociedade. Mas que isso – no caso a representatividade negra – não passou despercebido pelo público, isso é fato, o que é característico para se criar uma história alternativa numa narrativa de época, onde os brancos originalmente predominavam nas mazelas sociais.

Assim como a série de livros, Bridgerton não segue necessariamente uma ordem natural ao contar a história de cada um dos irmãos Bridgerton desde o mais velho – detalhe: para cada temporada, um dos oito irmãos Bridgerton protagoniza cada uma das oito temporadas – a começar pela primeira filha mulher e quarta dos oito irmãos, Daphne Bridgerton (interpretada por Phoebe Dynevor), que é introduzida à temporada social para conseguir pretendentes, quando ela conhece Simon Basset, o Duque de Hastings (vivido pelo então aplaudido Regé-Jean Page). A princípio, devido a um passado turbulento, o duque se recusa a casar-se, despertando o interesse das jovens da alta sociedade, assim como Daphne desperta paixão em pretendentes, mas com o desejo de se casar. Nisso, Simon e Daphne pretendem manter aparências até que o destino os une de maneira surpreendente. Além de nos mostrar as trajetórias do casal e dos constantes questionamentos tanto dos personagens quanto do público sobre quem é – de fato – a Lady Whistledown, Bridgerton também esbanja palavras e interpretação dos atores ao nos mostrar, em forma de crítica e sátira, como a alta sociedade é cheia de segredos, onde cada integrante da alta sociedade possui um segredo a ser cavoucado pelos colunistas de modo a provocar um alvoroço neste círculo importante da Regência Britânica.

Conforme a gente vê cada episódio de Brigerton, podemos perceber que van Dusen se manteve fiel ao livro a um certo ponto, mas que, no decorrer da trama até o final, onde há um gancho para a segunda temporada, a narrativa vai se tornando cada vez mais densa, romântica, dramática e de certo modo quente, como que se vê no polêmico sexto episódio da série. As atuações dos atores, sobretudo de Page, são a cereja do bolo para o sucesso da série, que promete ser um dos carro-chefe da Netflix (junto com Stranger Things), o que lhe rendeu uma indicação ao Emmy.

Bridgerton se encontra atualmente no catálogo da Netflix para quem quiser ver, enquanto que a segunda temporada, que deve contar com o primogênito dos Bridgertons, Anthony, está a caminho, e que com isso deve prometer mais opiniões, elogios e premiações, não sem antes de encarar os folhetins da coluna social de fofocas da Lady Whistledown, vivida com maestria na voz de Julie Andrews.


Arcane

 

Reinvenção da arte animada


Helena Galvão de Miranda Nunes 


Arcane, série animada produzida pela Netflix e criada por Christian Linke e Alex Yee, desenvolvedores da Riot Games, é um achado da revolução da arte animada. O roteiro de apenas seis episódios, contou com a mistura radical e arriscada de quatro conceitos visuais totalmente distintos para fazer a identificação de personagens, contextos e vivências diferentes que se complementam. 

Esses conceitos são a Deco art (Arte usada em linhas geométricas, retas, perfeitamente centradas), a Art Nouveau (conceito de arte francesa que utiliza traços delicados e floreados, muito usual em pinturas femininas), a arte Ciberpunk (concentrada em cores de tom escuro e explosivo, adeptos a arte industrial selvagem) e o solarpunk (Conceito futurístico que utiliza a natureza como base para construção tecnológicas. Quase industrial com a presença da natureza). Se não bastasse essa composição artística ousada na construção da animação, toda a série foi desenvolvida como se fosse para animar o primeiro art concept do projeto. Para quem não conhece, o primeiro art concept é o primeiro desenho, sem tantos detalhes, que incorpora a ideia que o roteiro deseja passar pelas imagens até ser aperfeiçoada e detalhada. Arcane foi uma jogada ousada em juntar todos os quatro conceitos de arte em caricaturas primeiras do projeto e animá-las, no limiar da arte realista e da caricatura de cartoons. 

Estratégia de gênio! Porque, além de ajudar a compor a identidade de todos os personagens que dão vida ao roteiro, ajudou a torná-los protagonistas de toda a história sem hierarquizar história e desenvolvimento de um personagem para outro, todos compõem um único protagonista: a vida em Piltover. 

A seleção de músicas, de igual valor arriscado, ajudou a compor uma trilha sonora épica facilitando na memorização de situações e condições a que cada espaço da animação foi submetida. Trazendo emoção e empatia a quem assiste a animação.

 Por isso, não é exagero dizer que o seriado animado Arcane, tanto pelo audiovisual, construção de roteiro, fotografia, é o exemplo da revolução artística que o mundo dos games conseguiu proporcionar.

nada ortodoxa

 O preço da Tradição


Nicole Fischer Carvalho

Introdução

A minissérie Nada Ortodoxa, produzido na Alemanha, criado por Anna Winger, Alexa Karolinski,  Deborah Feldman e Daniel Hendler, dirigido por Maria Schrader e distribuído pela Netflix, adapta o livro Nada Ortodoxa: Uma História de Renúncia à Religião, que conta a experiência de Deborah Feldman em uma comunidade judia ultra ortodoxa até sua fuga e seus desafios durante essa trajetória.

A trama gira em torno de Esther, uma jovem recém-casada que vive em uma comunidade judaica ultra ortodoxa em Nova York, que possui regras extremamente restritas de comportamento, vestuário, casamento e padrão de vida, abordando a história dessa personagem e as experiências pessoais da mesma em relação a cada regra imposta sobre ela e os costumes dessa comunidade, sendo o mais marcante e  decisivo para a fuga da personagem para fora desse cenários o casamento e o período de um ano após o matrimonio.

A série começa nos introduzindo a protagonista Esther Shapiro (Esty) que arrumas suas coisas e sai de maneira apressada de sua casa. Em seguida vemos Yakov Shapiro (Yanky), o marido de Esty, indo almoçar na casa de sua mão e perguntando a si mesmo e a família sobre o paradeiro de Esty. A terceira cena confirma as suspeitas dos espectadores, afirmando que Esty, gravida de cerca de um mês, estava fugindo da comunidade judaica para Berlim na Alemanha e gradualmente vamos nos aprofundando no passado de Esty e na comunidade judaica.

Personagens

Na obra, é possível dividir os personagens em 2 núcleos, o primeiro são o dos personagens dentro da comunidade (parentes, amigos, etc.) e o segunda são os personagens que Esty conhece em Berlim (amigos e o professor).

O primeiro núcleo representa o tradicionalismo e a repressão dos atos da protagonista, nele os principais personagens que podemos destacar é o Yanky e Moishe. O marido de Esty, Yanky, possui uma participação e um desenvolvimento importante para a trama. No início, ele é colocado como um rapaz gentil e envergonhado que se mostra animado com o casamento, mas a medida em que o jovem e Esty não conseguem “consumar o casamento”, devido ao desconforto da jovem, juntamente com a pressão familiar de sua mãe e outros familiares, ele vai se tornando cada vez mais grosseiro e bruto com Esty. Yanky ainda sofre uma segunda mudança, nessa ele começa a se arrepender e até corta os Peyot (cachos laterais usado por homens dentro dessas comunidades) para mostrar que vai romper com a tradição para ficar com ela e o bebê.

O segundo personagem importante dentro desse núcleo é o Moishe, ele representa a corrupção dentro da comunidade, visto que ele quebra diversas regras da mesma e mesmo assim é perdoado e acobertado pelo rabino e sua família. Fora isso ele é o responsável por ameaçar Esty de morte caso ela não volte, além de persegui-la e puxá-la a força, isso representa de maneira análoga as ameaças de membros de comunidades ortodoxas a desertores dessas mesmas comunidades, o que é observado atualmente.

O núcleo secundário, representa a liberdade e é responsável por ajudar no amadurecimento e no aprendizado da protagonista sobre o mundo fora de sua comunidade. Nesse grupo é importante destacar Leah Mandelbaum, mãe de Esty, que embora tenha nascido na comunidade, fugiu para a Alemanha ainda quando a filha era pequena e volta antes do casamento da filha para entregar a cidadania alemã a mesma e tentar aconselhá-la, mesmo que ela não tenha ouvido. Essa personagem é importante para mostrar um ciclo que se repetiu de casamento, infelicidade no matrimônio e fuga, mas o que difere a história das duas é que a filha trouxe consigo o bebê ainda dentro da barriga.

Narrativa

A narrativa segue intercalada entre o passado e o futuro em dois grupos diferentes (O de Esty na Alemanha e o de Yanky e Moishe que seguem em busca da mesma), ela vai lentamente nos apresentando o desconforta da protagonista dentro da comunidade, à medida que em somente 4 episódios de 1 hora cada, consegue fazer os espectadores sentir e se apegar as dores e felicidade de Esty, que torce pela liberdade da protagonista e o sucesso no processo para adentrar no conservatório. Entretanto, a narrativa não deixa de lado a perspectiva de Yanky, que desperta no final uma empatia com o público genuína ao se arrepender e em um surto de desespero tentar renegar a comunidade ao cortar os Peyot para ficar com Esty e o bebê.

Aspectos Técnicos 

Nos aspectos técnicos, a série possui um desempenho muito bom, a fotografia condiz com a proposta, as atuações são excelentes principalmente a de Shira Haas que vivência a protagonista, dando alma a mesma e passando um grande entendimento da personagem, modelando de maneira cirúrgica todas as fases da personagem desde o descontentamento e tristeza a surpresa e felicidade. Minha menção honrosa fica para a cena em que Esty vai ate um telefone e liga desesperada para sua avó, o desempenho da atriz nessa cena passa ao espectador a explosão de todo o desespero e ansiedade que vai aos poucos se acumulando na personagem desde sua partida da comunidade. O roteiro se mostrou inteligente ao crescer a narrativa a medida em que vamos nos aprofundando com a personagem. A trilha sonora combina coma proposta e ajuda na construção dos momentos importantes, principalmente nas cenas mais dramáticas.

Apresar de todos esses aspectos serem bons, o que mais foi aperfeiçoado na série é a ambientação e a produção em torno dos costumes e vestimentas, eles foram cuidadosamente pensados e assertivos, desde a contratação de um estudioso da língua Iídiche falada em mais da metade da serie, para ensinar os atores, até a visita e consultoria de pessoas próximas dessa cultura. De longe o momento em que todo esse esforço fica claro é o do casamento, que exigiu uma super produção e um cuidado excessivo da produção com os detalhes.

Temas e Críticas abordados 

Dentro os diversos temas relatados na obra podemos citar como os principais: a pressão familiar, o choque cultural, casamentos arranjados, perseguição e ameaça, isolamento de comunidades, liberdade de escolha, separação familiar, tradição contra modernidade e passado contra presente (histórico). Cada tópico desse, foi explicitado por cenas dentro da trama, alguns de maneira mais critica e outros mais brandamente, sendo a dualidade entre tradição e modernidade relacionado com a liberdade de escolha o mais criticado e o foco principal da crítica da série.

Audiovisual e Contemporaneidade

A produção foi baseada e adaptada a partir da história de  Deborah Feldman, mas ao contrário de que muitas pessoas pensam o causo da autora não é uma exceção rara de ser encontrada, existem diversos casos de pessoas que fogem dessas comunidades de judeus ortodoxos e são perseguidas, essas sofrem do mesmo modo que a protagonista quando vai para Berlim por não ter familiares, dinheiro ou educação adequada para conseguir um emprego e se sustentar, devido a isso muitos desses ex membros passam dificuldades. A questão fica ainda mais seria quando contabilizamos os inúmeros relatos de abusos e violência as mulheres e crianças. Ademais, as jovens que possuem filhos e saem da comunidade em sua grande maioria acabam perdendo a guarda das crianças para os pais ou parentes que ainda estão nas comunidades.

Considerações Finais 

Logo, a obra Nada Ortodoxa embora só tendo adaptado cerca de cinquenta por cento de uma historia real, complementado o restante com ficção, não deixa de refletir uma realidade análoga de varias pessoas, reproduzindo quase a risca os costumes e tradições dessas comunidades, trazendo diversas reflexões profundas e envolvendo o espectador no dilemas da protagonista em apenas 4 horas de serie. Assim, pode-se dizer que a minissérie Nada Ortodoxa é um acerto da Netflix que mexe em questões atuais e polemicas de modo delicado e preciso.


Steven universo

 

– UMA HISTÓRIA SOBRE CONEXÕES 

GABRIEL RODRIGUES SANTOS

Na primeira vez que ouvi falar sobre Steven Universo, confesso que não chamou muito a minha atenção — apesar de sempre amar desenhos — esse em questão me soava como algo infantil que não conseguiria tirar nenhum grande proveito, lembro que meu amigo não parava de comentar sobre a criadora chamada Rebecca Sugar, contando de seus grandes feitos em outros desenhos como “A hora de aventura”, sua conquista como ativista LGBT+ e a composição de músicas para inúmeras animações. Mas só após muita insistência dele me dei a oportunidade de conhecer esse universo que hoje sinto que deveria ter conhecido antes. 

Steven é o protagonista de seu própria série de desenho, um garoto que mora em uma cidade litorânea com sua família bastante inusitada, composta por 3 mulheres alienígenas cuja a espécie — chamada Gem — veio ao planeta terra há milênios anos atrás com o intuito não bem sucedido de colonização, em sua forma física dão vida a pedra que as representa, no caso dessa família; Ametista, Garnet e Pérola. Com o desenvolver do desenho entendemos que essas 3 mulheres faziam parte de uma equipe chamada Cristal Gems — Gems rebeldes que negaram seu planeta natal para defender a terra de sua própria espécie — nessa equipe a líder era Rose Quartz, falecida mãe do Steven, que se casou com um humano, fazendo do menino uma nova espécie entre essas duas. 

Tendo em mente que esse desenho foi inicialmente desenvolvido para o público infantil, me impressiona a naturalidade de tratar sobre assuntos que muitas vezes os pais não conseguem desenvolver tão facilmente com seus filhos. Não muito longe do início somos apresentados o conceito de fusão, que seria a união entre duas ou mais Gems através de uma dança formando um novo indivíduo, com sua própria pedra e novos poderes, algo interessante a se ressaltar é que a fusão pode acontecer independentemente da igualdade das pedras — Pérolas com Ametistas, Peridotes com Garnet e assim por diante — algo que em seu planeta natal é visto como uma aberração e infração à ordem natural das coisas. Steven Universo consegue fazer analogias que não passam despercebidas, relacionando as fusões a relacionamentos de todos os tipos.

Um bom exemplo de como o desenho consegue introduzir assuntos que são ratados como impróprios para crianças, é a relação da Lápis Lazúli, que para salvar o Steven vai se fundir com a Jasper — até então vilã do desenho — aprisionando a fusão Malaquita dentro do oceano por uns bons episódios. Após Lápis finalmente conseguir se libertar da fusão com sua inimiga, podemos ver através de falas e expressões que ela está muito magoada e traumatizada com tudo que passou, Steven — como um bom empático que é — tenta de todos os jeitos ajudá-la, fazendo ela dizer o que realmente está sentindo após essa experiência.

Já nesse episódio conseguimos sentir o quão profundo esse desenho vai se tornar, quando Lápis diz que sente culpada por estar com saudade da fusão com Jasper — que tanto a machucou — logo me caiu a ficha ao fazer uma analogia com um relacionamento abusivo, que infelizmente ainda é realidade de muitas pessoas, onde ficamos com parceiros que nos colocam pra baixo e nos magoam, mas ainda sim é muito difícil sair dessa situação e muitas vezes a saudade vai ser um sentimento recorrente.

Fui surpreendido positivamente ao encontrar em um desenho dito infantil tantos debates que não ocorrem tão naturalmente em filmes e séries para adultos, Steven em contramão do pensamento retrógrado da maioria, consegue atingir com maestria seu principal objetivo de levar a empatia, amor e respeito a todos que tiram um momento ara embarcar em seu vasto universo.


terça-feira, 8 de fevereiro de 2022

Euphoria

 

 
Maria Eduarda de Freitas Soares 


Criada por Sam Levinson, a série Euphoria é uma obra distribuída pela HBO Max via streaming, que narra a história de vários adolescentes e suas famílias, focando no backstory e traumas dos personagens principais a cada episódio e como seus problemas passados construíram suas personalidades conturbadas. 

Indicada apenas para maiores de 18 anos, a série foca em problemáticas como abuso de substâncias, relacionamentos abusivos, transtornos psicológicos, tráfico, entre outras, mostrando o pior lado dessas questões e sem romantizar em nenhum momento os acontecimentos, trazendo uma forte reflexão para os demais espectadores. 

Os episódios são narrados pela protagonista Rue, uma personagem viciada em drogas, que por as vezes desmentir sua própria narração, faz o público se questionar sobre a veracidade dos seus depoimentos, assim, a série finda por prender a atenção de quem a assiste por ser altamente interpretativa, alimentando diversas teorias de seus ouvintes. 

Por conta dessa subjetividade, o público não consegue ter a certeza de se a protagonista Rue vai estar ou não morta ao final da série, pois diversas vezes a personagem participa de cenas relacionadas a vida e morte, juntamente com referências a religião, como a aparição de Rue na igreja de sua cidade após estar sob efeito de substâncias e de referências a outros filmes, como por exemplo Titanic (1997), com Rue vivendo somente personagens (ex: Jack) que acabam morrendo em suas obras, porém é realmente difícil ter certeza de se o que aconteceu foi overdose ou só efeitos das drogas usadas pela mesma. 

A composição das cenas em Euphoria são perfeitamente calculadas e projetadas, com diversas referências a obras cinematográficas, como O Segredo de Brokeback Mountain (2005) e Ghost – Do Outro Lado da Vida (1990), e uma fotografia impecável, utilizando de luzes, sombras, enquadramentos, maquiagens icônicas e lindas paletas de cores, para mostrar como os personagens estão se sentindo no momento e a evolução de cada um. Um exemplo de cena com ótima composição, é a cena em que Nate, um dos personagens principais, após ouvir seu pai, que estava bêbado, colocar para fora de si tudo que havia guardado por anos sobre o que sentia sobre sua sexualidade e enfim se libertar de sua prisão mental e ir embora, é visto no fim da cena pela janela da casa, como se a janela fosse uma cela e agora o personagem Nate fosse o único aprisionado por reprimir seus pensamentos e sentimentos. 

A série é incrivelmente viciante, o que faz a audiência esperar ansiosamente pelo próximo episódio para finalmente descobrir o desenrolar da história, e juntamente da atuação impecável das personagens e da química dos atores, Euphoria se tornou uma das melhores séries adolescentes já produzidas da contemporaneidade.

Ozark

 

Uma série diferente

Arhur Torres


Desde sempre os seriados e filmes policiais nos chamam atenção, pessoas da lei que esbanjam justiça e moral, criminosos inescrupulosos capazes de fazer de tudo, investigações tensas que nos prendem até o fim da trama, e a violência as vezes glamourizada ou exagerada. Assistimos narrativas pela perspectiva dos agentes da lei, como é o caso de “Tropa de Elite”, “Duro de Matar”, “Bad Boys”, etc. E também assistimos obras que contam a visão dos infratores da lei, como é o caso de “Scarface”, “Poderoso Chefão”, Breaking Bad. Geralmente em ambos os casos, vemos as visões de figuras importantes nessas situações criminais, desde chefões do crime, traficantes de droga, e policiais experientes e determinados. Contudo, a Netflix lançou em 2017 uma série que quebra um pouco desses paradigmas.

Ozark conta a história de Marty Bird (Jason Bateman) e Wendy Bird (Laura Linney), em decorrência de um erro do sócio de Marty, eles são ameaçados de morte por um cartel mexicano, e após isso precisarão levar sua família disfuncional para lavar dinheiro no interior dos EUA em troca de suas próprias sobrevivências. O casal é forçado a entrar nessa situação e, mesmo desejando sair dela, vão perdendo toda a inocência com o tempo. Enquanto isso, eles precisam conciliar a vida criminosa com a familiar, omitindo o real motivo daquela situação para os filhos.

A série não foca em um macrocosmo criminal, tiroteios intensos, maquiavelismos e violência fantástica são quase inexistentes, prioriza-se mais o desenvolvimento psicológico da família Bird e daqueles envolvidos na vida criminosa da cidade interiorana de Ozark. A fusão do núcleo familiar e criminoso do casal de protagonistas permite uma dinâmica angustiante, possibilitando colocar aquelas personagens no seu limite, garantindo uma atuação excepcional de Jason Bateman e Laura Linney.

O roteiro surpreende, apesar da previsibilidade de sabermos que a família está protegida pela narrativa, pois caso morram a história não prosseguirá, o mesmo não vale para as personagens a sua volta. Ozark investe uma parte considerável de seu tempo de tela no desenvolvimento de coadjuvantes e até antagonistas, não há maniqueísmos, as personagens tem motivações, crenças e traumas provocadores de suas atitudes. Observa-se isso bastante na personagem Darlene Snell (Lisa Emery), sua personalidade impulsiva e caótica é responsável diversas vezes em criar reviravoltas narrativas, das quais resultam em problemas para os planos dos protagonistas e na subversão de crenças por parte do telespectador.

Mesmo com o enorme sucesso, Ozark planeja encerrar sua história na 4ª temporada. É valorosa a forma que a série nos faz ter empatia, vibrar e temer por figuras criminosas e facilmente detestáveis na vida real. A história do casal que lava dinheiro não se propõe a tornar grandiosa e arquetípica como tantas outras, não assumindo que tramas que optem por essa abordagem sejam inferiores ou ruins, porém Ozark tem outra abordagem. A série nos conta um drama familiar intenso, principalmente o do casal principal, e, ao mesmo tempo, um problema externo ameaçador de toda a vida daquela família. Com isso, recomendo a série para quem gosta de bons diálogos, personagens bem construídos e uma trama inteligente que surpreende quando ninguém espera. Em meio a tantas séries produzidas pela Netflix, pode-se dizer que Ozark é uma joia rara entre elas.