quarta-feira, 9 de fevereiro de 2022

The White Lotus

 


A Sátira ao Privilégio de Raça e Classe

Anna Giulia Canestraro

A série de 2021 de comédia dramática da HBO acompanha três núcleos de hóspedes do resort de luxo White Lotus, no Havaí, além do núcleo dos funcionários. Entre esses hóspedes temos uma família que discute o politicamente correto enquanto usufrui do seu privilégio branco, um casal em lua de mel que descobre – tarde demais – que não tem muito em comum além da relação de interesse de esposa-troféu e herdeiro e uma mulher extravagante e carente de meia idade. Os personagens são apresentados, mas não passam por grande aprofundamento, o que leva a acreditar que a intenção é construir personagens genéricos, uma caricatura da burguesia.

The White Lotus se desenrola então com cada um desses núcleos acontecendo simultaneamente e eventualmente se cruzando. E cruzando também com a trajetória dos funcionários, em especial, o gerente Armond (Murray Bartlett) e os funcionários Belinda (Natasha Rothwell) e Kai (Kekoa Kekumano), que exercem um importante papel na crítica da série, pois, na tentativa tanto de contrariar as vontades dos hóspedes, quanto de se aproximar e acreditar em falsas e egocêntricas promessas sofrem consequências que os levam a ter destinos trágicos em detrimento das ações dos hóspedes para com eles, enquanto os culpados seguem com sua realidade privilegiada intacta.

Interessante notar que os personagens apresentados como mais humildes, que seriam os funcionários, a esposa bancada pela família do marido e a amiga latina da filha da família principal não têm nome completo na série. Apesar de ser implícito que possuiriam sobrenomes, são chamados durante toda a narrativa apenas de Armond, Belinda, Kai, Rachel e Paula, enquanto os demais são apresentados logo de início pelos sobrenomes Mossbacher, Patton e McQuoid. Esta também pode ser considerada uma sútil crítica à desigualdade social, uma vez que chamar alguém pelo sobrenome culturalmente é uma indicação de respeito, além de, nesse caso, indicar também uma herança social, pois fica entendido que todos os hóspedes são provenientes de famílias ricas e que os privilégios os acompanhariam há gerações – e por gerações. Já funcionários e acompanhantes desses herdeiros não são tratados como merecedores do mesmo prestígio social, refletindo uma realidade da sociedade.

O roteiro é repleto dessas sutis críticas e consegue provocar ora vergonha alheia, ora comoção, ora raiva. Provando assim que mesmo em um enredo onde aparentemente não haveria muito “caldo para espremer” (a rotina de pessoas em um resort indo à praia, à piscina, jantando, frequentando o bar do hotel e repetindo tudo de novo no dia seguinte) um roteiro cômico e afiado na ironia pode dar outro sentido e tornar a narrativa envolvente.

A trilha sonora também tem a sua responsabilidade por cativar a atenção do espectador. Isso porque ela é composta por instrumentos agudos discordantes em constante aceleração misturados com gritos de animais, criando uma atmosfera de suspense, mesmo a série sendo cômico-dramática. O diretor da série descreve essa atmosfera como a de um “sacrifício humano” e pode-se acreditar que assim tenha sido feito para acentuar a situação de exploração de uma classe sobre a outra, de forma agoniante para esta segunda e gerar essa sensação de ausência de possibilidade de escapatória.

A obra é assinada por Mike White, conhecido por Dawson’s Creek, Freaks and Geeks e Escola de Rock. Além dele, a série também conta com elenco de peso, como Steve Zahn (Capitão Fantástico), Connie Britton (American Horror Story), Jennifer Coolidge (Legalmente Loira) e Sydney Sweeney (Euphoria). Elenco esse que, não atoa, mistura nomes famosos da comédia e do drama, bem como a mistura que The White Lotus propõe e executa com sucesso.



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