sábado, 26 de novembro de 2022

Eles Não Usam Black-Tie

RESENHA CRÍTICA – “Eles Não Usam Black-Tie” (1981)

Ionathan Gregory de Santana Cavalcanti

Em um contexto em que a ditadura militar dava indícios de estar enfraquecendo é que foi lançado o longa-metragem “Eles Não Usam Black-Tie”, do diretor Leon Hirszman. O filme, de 1981, mostra uma sociedade começando a vivenciar um respiro dos anos de brutalidade – anos estes em que o operário Otávio, um dos protagonistas, chegou a ficar preso. Tião, filho de Otávio e operário na mesma fábrica metalúrgica, descobre que Maria, sua namorada, estava grávida, ao mesmo passo em que se emergia uma tremenda greve sindicalista na fábrica. Os conflitos não se dão apenas na greve, mas também entre pai e filho, que entram em desavença por divergência de interesses e ideologias. Otávio, corajoso líder sindical, não se acanhava frente às opressões sofridas pela classe operária e militava pelos direitos seus e dos seus colegas. Já Tião, mais jovem, almejava outra perspectiva para a sua vida e, agora, para a vida de seu filho.

“Eles Não Usam Black-Tie” traz uma representação fiel e pontual do cenário político de 1980. Tião e Maria eram parte de uma geração cheia de incertezas, que nasceu já dentro da ditadura e viu as marcas do autoritarismo entre os seus. O medo e a esperança andavam juntos. Tião cede ao medo, justamente, por esperança de que fosse essa a melhor saída, caso a história os levasse pelo caminho em que sua família possivelmente passaria fome, mas enfrenta o alto preço de se acovardar e trair os seus aliados. Ao contrário do filho, Otávio acreditava na luta de classes como veículo de mudança e como forma de recuperar dias melhores que já vivera antes da ditadura. Isso nos proporciona enxergar tamanha polarização política da época e como a repressão coloca o povo contra o povo. Em diversos momentos, a obra também expõe e denuncia a tirania policial.

O filme, que conta com grandiosos nomes das artes cênicas brasileiras, como Fernanda Montenegro e Milton Gonçalves, não deixa a desejar em nada no quesito técnico e artístico, com imagens e cenografias muito reais. Sendo um filme lançado e que se passa durante a ditadura militar, “Eles Não Usam Black-Tie” chegou a ser censurado, mas também foi vencedor de três troféus no Festival de Veneza. Ambos os acontecimentos foram obtidos pelo fato do filme, adaptação da peça de Gianfrancesco Guarnieri (Otávio), ser uma denúncia em relação à violência militarista e ao totalitarismo que ainda pairava no ar. Todas essas características fazem do filme um longa-metragem emocionante, extremamente precioso na história do cinema brasileiro e que planta uma semente de reflexão crítica e social no telespectador.

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